sexta-feira, 11 de março de 2011

Pronto pra outra

A viagem acabou e naturalmente extinguiu-se a razão de ser deste blog. Deixo este breve post como uma espécie de fecho e a partir de segunda-feira volto ao endereço tradicional, no De Olho na Capital, falando menos de mim e mais dos que lidam com o nosso dinheiro.

Pra encerrar, um pequeno album de retratos:
Rio Don, em Aberdeen, visto da sala da casa do Nicolas. Foto: Pedro Valente
Manezinhos em Londres, fotografando o parlamento e o big-ben. Foto: PV
Lúcia e eu com o Nicolas, razão da nossa estadia prolongada por lá. Foto: Marta Leite
Augusto, o neto mais velho, que fez um ano dia 28, em Brasília. Foto: André Valente
Augusto já tá quase andando. E o Nicolas tá aprendendo a sorrir.
Conflito familiar: Danilo, pai do Nicolas, é Figueirense. O Vô Paulinho (na foto) é Avaí...
 Foi uma boa experiência, cheia de novidades. Nunca tinha ficado tanto tempo no exterior (na verdade, fiquei no interior, numa cidade relativamente pequena, mais ou menos do tamanho de Florianópolis). E nunca tinha indo tão ao norte do mundo. Também nunca tinha passado Natal com neve. Nem caminhado tanto na rua em temperaturas tão baixas.

Agora fico torcendo para que os outros dois filhos que ainda moram no Brasil arranjem uma ocupação fora e se mudem logo, pra gente ter pretexto para viajar de novo... como se precisassemos, Lúcia e eu, de pretexto pra colocar o pé na estrada. Mas agora acho que ficaremos por aqui. Pelo menos durante os próximos meses. Até breve.

domingo, 27 de fevereiro de 2011

Ainda bem que sou baixinho

ALGUMAS OBSERVAÇÕES SOBRE A CLASSE TURÍSTICA DOS AVIÕES

Se tem um lugar em que os mais altos (e fortes, e bonitos) não levam qualquer vantagem e, ao contrário, são penalizados, é na classe turística dos aviões de longo curso. Os aviões crescem, mas o espaço entre as poltronas (melhor chamá-las de cadeiras, porque poltrona dá idéia de uma coisa confortável e bem acolchoada) diminui. Desconfio que mesmo a largura de cada banco venha se estreitando lentamente ao longo dos anos.

Minha filha, no ano passado, viajou de Nova Iorque à Europa num desses Airbus 380, com dois andares, o maior avião de passageiros atualmente em atividade. Os assentos da classe turística eram ainda mais apertados que os dos Airbus menores. Viajei neste final de semana e posso estar exagerando, mas a cadeira do pequeno Embraer 145 que nos conduziu de Aberdeen a Londres, nada ficava a dever à cadeira do majestoso boeing 777 que nos trouxe de lá até Guarulhos. Sei que os dois assentos têm enormes diferenças, mas a sensação que se tem é que o aperto é semelhante, apesar do 777 poder acomodar vários 145 dentro dele.

"TOUCH-SCREEN" ESSA INCOMPREENDIDA

De uns tempos para cá, a pretexto de oferecer diversão e distrair os apertados passageiros, as empresas aéreas oferecem telas de vídeo individuais, colocadas no espaldar da cadeira da frente. São acionadas pelo toque dos dedos na tela. O que é uma forma sutil de dizer que a tela tem que estar ao alcance das mãos. De um encosto ao outro, a distância é praticamente de um braço.

Outro problema dessas telas sensíveis ao toque, é que multidões não entendem que toque é só encostar ou passar os dedos. Acostumados a décadas de aparelhos com teclas, em que é preciso pressionar o dedo, até com certa força, o que se vê é o sujeito da cadeira da frente balançar a cabeça sempre que a pessoa atrás resolve mudar de canal.

Próximo de mim uma senhora, espremida entre dois outros passageiros, tentava se distrair jogando paciência. As cartas eram movidas com o toque dos dedos. Mas ela, acostumada com as teclas, batia na tela com a ponta de sua unha bem feita do indicador. Com força. Como se estivesse tocando piano num bar barulhento e precisasse fazer soar as cordas ao máximo. A pessoa sentada à frente parecia um guitarrista metaleiro, sacudindo a cabeleira para frente e para trás.

TADINHO DO GRANDÃO

A meu lado, coitados, viajaram dois jovens, provavelmente ingleses, bem mais altos que o meu modesto 1,70 m. Um deles tinha estrutura e estatura daqueles galalaus que remam nas competições universitárias do Reino Unido. Até me senti melhor acomodado quando vi a dificuldade que tinham em encontrar posições, durante as onze horas do vôo, para seus longos braços e pernas. Se fossem um casal, poderiam como Lúcia e eu fizemos, encostar um no outro, apoiar o travesseiro no ombro do parceiro, tentando enganar o fato de que a cadeira não reclina quase nada e que depois de certo tempo tem-se vontade de deitar no chão do corredor.

E olha que, previdente, economizei um dinheirinho para poder comprar um dos tais "assentos conforto". Sabe aquelas fileiras de assentos diante de saídas de emergência ou logo depois das "galley" (aqueles compartimentos onde o serviço de bordo é preparado)? Pois é, têm um pouco mais de espaço porque não têm, diante de si, outra fileira de cadeiras. A TAM cobra uma tarifa extra pelo uso daquelas cadeiras, porque sabe que, numa viagem longa, alguns centímetros a mais podem fazer muita diferença.

No caso de baixinhos como Lúcia e eu, esse espaço significa que podemos colocar a malinha de mão no chão e apoiar os pés, para poder ficar numa posição um pouco menos cansativa. No caso dos meus enormes vizinhos, o alívio parece ter sido pequeno. Tá certo que não precisaram ficar apoiando o queixo no joelho, como o pessoal grande das fileiras normais, mas permanece o fato de que as cadeiras reclinam miseravelmente e a largura impede movimentos de ajuste do corpanzil. Menos mal que jovem se recupera rapidamente de noites maldormidas.

O aglomerado, apertamento e promíscua proximidade (um avião como o 777-300 da TAM transporta 305 almas na classe econômica) faz com que a gente acabe criando uma intimidade instantânea compulsória com desconhecidos. Cheiros, ruídos e roçar e braços e pernas durante longas horas, podem levar o passageiro desavisado ao pânico total. Ou ao desespero. O grandão ao meu lado, mal acomodado, tentando se equilibrar num travesseiro minúsculo, pega no sono, apesar de tudo. A certa altura, nada impede que ele desabe sobre mim. E dependendo do peso do sono, babe e ronque na maciez da minha cuidadosamente cultivada barriga. Esse temor faz com que meu cochilo seja entremeado de espiadelas pra ver se o vizinho ainda estava nos seus limites.

"DARIA TUDO POR UMA CAMA!"

A TAM tem dois vôos de Guarulhos a Florianópolis, para conduzir os passageiros que chegam do exterior de manhã. Um às sete e meia da manhã, outro às três e meia da tarde. Nós chegamos às cinco e meia. Teoricamente, poderiamos pegar o avião das sete. Afinal, são duas horas. Mas, na prática, é impossível. Primeiro porque as malas levam séculos para chegar até a esteira. Depois, porque tem fila enorme para passar pelo crivo da Receita Federal (sempre parece que todos os vôos chegam no mesmo horário que o nosso).Com sorte (e sem passar na duty free), consegue-se sair uma hora e meia depois de aterrissar. Daí, ainda precisa contar com a boa vontade do pessoal do check-in de conexão. Ou seja, a partir das cinco da manhã, a turma vai mesmo pra Florianópolis no vôo das três e pouco.

O que fazer, se depois de uma noite maldormida de aperto, sufoco e sustos, ainda temos que ficar umas seis ou oito horas no aeroporto? Ahá! Agora todos seus problemas estão resolvidos. Guarulhos já tem um hotel da rede Fast Sleep. São pequenos quartos, quase casulos, com beliches, para um descanso de algumas horas. Banheiros limpos, bom chuveiro, toalhas, completam o cenário. Resultado: na hora de entrar no avião para Florianópolis, a gente já está limpo, descansado, quase refeito e até sorridente.

Alguns poderão dizer "é caro!" (R$ 150,00 por um período de cinco a oito horas). Caro é o tal de "assento conforto" da TAM. Que custa 50 dinheiros. Se o vôo estiver indo ou saindo da Europa, 50 euros. Se do Reino Unido, 50 libras. O que é uma sacanagem. A libra vale mais que o euro. O banho e o soninho numa cama horizontal depois de onze horas de apertamento, não tem preço.

Claro que quem tem milhas suficientes para voar de classe executiva, ou é funcionário graduado de empresas que pagam executiva, ou tem boquinha no governo brasileiro e vai de primeira classe, tem direito, após ao vôo, a banho e descanso nos "lounges" que as empresas mantém nos principais aeroportos. Mas a turma da turística, até agora, tinha que amargar a espera nos bancos dos aeroportos, curtindo o amarfanhado da travessia noturna.

"ISSO É UMA INJUSTIÇA!"

Essa história de "assento conforto" ainda gera muita angústia em quem não conhece as regras. O vôo para Florianópolis estava lotadaço. Só tinham, vagas, quatro ou cinco poltronas do tal "assento conforto" nas saídas de emergência. A gritaria foi grande, porque a turma não aceita que tenha que viajar entre dois gordos enquanto uma linda poltrona de corredor está vazia, ao lado do célebre e sempre interessante Tio Cesar. O aeromoço explica que ali custa mais caro, aí o passageiro tira dinheiro do bolso e quer pagar, mas o problema é que essa compra tem que ser feita no check in, não tem como fazer nem antes, nem depois. A criatura, bufando, encerra o show. Mas antes fuzila, com o olhar, todos aqueles idiotas que estão com as pernas esticadas.

Mal sabe ele que, nos vôos domésticos, metade dos tais "assentos conforto" das saídas de emergência não reclinam. É uma opção entre pagar a mais para esticar as pernas ou ficar com o joelho nas costas do outro, mas pelo menos reclinar a poltrona alguns graus (aposto que não chega a 10º).

Mas, no fim das contas, em menos de 30 horas passamos de um calorão de 13º para um forno a 30º. Trajeto que nossos antepassados levavam meses para cumprir. Em condições muito piores (isso quando não eram arrancados de suas casas, na África, e trazidos nos porões fétidos do vergonhoso comércio de gente que o Brasil custou a abdicar). E, o mais importante: as malas chegaram junto conosco. Todas elas, no mesmo vôo. E com todo o seu conteúdo intacto!

Para completar, só faltava amanhecer o domingo fresquinho, com vento sul. ;-)

quinta-feira, 24 de fevereiro de 2011

Acabou-se o que era doce

Avós corujas babam sobre Nicolas, o neto mais recente.

Com a chegada dos outros avós do Nicolas (Paulinho e Maria Marta, pais do Danilo) a Aberdeen pra ajudar a cuidar do neto, termina nosso turno de guarda. Lúcia e eu estamos fazendo as malas, depois de uma estadia de mais de dois meses por aqui. No último mês, aprendendo a conhecer essa figurinha que é o Nicolas.

Com o final da viagem, este blog começa também a ser desativado. Provavelmente, ao chegar ao Brasil, ainda colocarei mais alguma coisa das muitas que gostaria de ter contado e não tive tempo. Por exemplo: neste tempo em que fiquei aqui fui mais ao cinema do que nos últimos dez anos no Brasil. Queria comentar isso com vocês e tentar descobrir o por quê.

Também fiquei devendo mais fotos e vídeos do dia a dia do interior da Escócia (favor não confundir Escócia com Inglaterra, eles ficam chateados). E dependendo do que ocorrer, a volta talvez renda alguma historinha. Na vinda pra cá, uma nevasca fechou o aeroporto de Londres e fomos parar em Madri (quem não viu o começo do blog, pode dar uma navegada ali nos arquivos, na coluna da direita. Não tem muita coisa, é só de janeiro pra cá).

Então é isso. Quando chegar ao Brasil, depois de pegar um sol, tomar um banho de mar e descansar um pouco, voltaremos a conversar.

terça-feira, 22 de fevereiro de 2011

Mais um passeio de trem

Estamos arrumando as malas pra voltar e o tempo pra manter a atualização destas maltraçadas anda escasso. Mas pra não dizerem que eu os abandonei, taí mais um trailer espetacular de um filme que nunca foi feito. Nele vocês poderão ver a vida dura que levam o vô Cesar e a vó Lúcia.

Enjoy.

segunda-feira, 14 de fevereiro de 2011

Vai um valentines aí?

Hoje, aqui por esses lados, comemora-se o dia de São Valentino. Não tenho a menor idéia por que, em algum momento da história, a data em que um mártir cristão morreu, na longínqua Roma do ano 269 (ou 270), virou o momento ideal para expressar amor, carinho e outros sentimentos semelhantes.

Não existem registros confiáveis sobre essa história. Há até quem diga que viveram na época e naquela região três Valentinos (um nome muito popular, com certeza) que foram perseguidos por sua fé e acabaram mortos no mesmo dia. E, pra facilitar, tem as versões dos protestantes e dos católicos, cada um puxando a piedosa brasa para seu turíbulo.

Bom, diz uma das lenda que o Valentino esse, quando na prisão, curou milagrosamente a cegueira da filha de seu carcereiro, pouco antes de ser morto da forma mais terrível, como era rotina matar cristãos naqueles dias. Ele foi preso e morto (ou, como dizem os jornais brasileiros de uns tempos pra cá, "teria sido preso e morto") porque era um bispo que, secretamente, fazia casamentos dos soldados, contra a ordem romana que proibia casamentos de jovens. Não ficou claro pra mim se os soldados casavam entre si ou com mulheres.

Seja como for, naquela época, não sei se vocês lembram, havia uma certa relação de causa e efeito: o mártir virava santo. E alguns séculos depois um papa atribuiu o dia 14 de fevereiro a São Valentino.

Aquele boa praça que contrariava a ditadura romana, unia casais enamorados e acabou devorado pelos leões (pelo menos foi isso que aprendi nos filmes americanos sobre a Roma antiga) parece que, ao longo dos séculos, emocionou o povo de muitas regiões. E o dia de São Valentino ficou sendo aquele dia em que a gente manda valentines (bilhetinhos escritos à mão com trovinhas carinhosas) para as pessoas queridas.

Mais tarde, a implacável máquina comercial de moer feriados, transformando-os em apelo para vendas, apropriou-se também desta data. E haja caixa de chocolate em formato de coração, cartões impressos com todo tipo de mensagens, para todos os gostos e também (em grande número) para os e as sem gosto. E hoje a gente se sente obrigado a dizer "I love you" para alguém. Nem que seja para o gato de estimação.

Diferentemente do nosso dia dos namorados, pais podem dar ou mandar valentines para seus filhos, amigos podem trocar valentines sem necessariamente virar uma proposta para "ficar" ou coisa parecida. Mas, é claro, o mais comum é que os apaixonados sejam levados a cumprir essa obrigação social. Imagina, não se pode deixar a esposa, noiva ou namorada chegar no serviço sem um valentines que possa exibir, orgulhosa, como atestado de que alguém a ama. Nem que seja só hoje. E porque a TV insistiu, durante toda a semana, que era preciso fazer alguma coisa.

Em todo caso, pra entrar no clima, vou dar um colinho especial para o neto, um abraço na filha, um olhar amistoso para o genro e inventar alguma coisa nova pra dizer pra Lúcia. Que, desde 1970, quando publiquei a primeira crônica declarando meu amor ("ela tinha 15 anos, seu pedófilo!"), já ouviu de mim tudo que um homem pode dizer para uma mulher. Desde o clássico "sim, querida", até propostas mais ousadas ("posso deixar a louça pra lavar amanhã?"), passando por todo aquele elenco de palavras carinhosas (e absolutamente verdadeiras) que o homem aprende a dizer sem pensar quando a mulher, arrumada, pergunta "como estou?"

Happy Valentine's day pra vocês também.

quinta-feira, 10 de fevereiro de 2011

Atendimento em domicílio

Aqui são quatro da tarde e estou quietinho, na mesa da copa, escrevendo estas maltraçadas enquanto ali, na sala, o Nicolas recebe a visita de uma agente de saúde pública especializada em grávidas e pós-grávidas e seus nenens (uma midwife, que tem curso de três anos para exercer sua atividade). Desde que ele nasceu ela tem aparecido de dois em dois dias. Agora está sendo pesado e examinado. Em seguida, sem pressa, ela ouvirá as dúvidas da mãe, explicará o que for necessário e fará anotações no caderno que acompanha o nenem desde a maternidade. Depois dos dez primeiros dias, as visitas ficarão mais espaçadas.

Todo o acompanhamento da gravidez, o parto e agora o acompanhamento do recém-nascido é feito gratuitamente pelo governo britânico. Por ordem de Sua Majestade, provavelmente. E isso de vir alguém em casa (sim, sim, todas as casas, qualquer casa, onde quer que tenha um recém-nascido registrado no SUS daqui) dá enorme tranquilidade para as mães estreantes. Elas estão, como é fácil imaginar, repletas não só de leite, mas também (e talvez principalmente) de dúvidas. Ter alguém a quem perguntar sem ter que ir atrás, na rua, em algum posto de saúde lotado, é muito tranquilizador.

O Nicolas, a proposito, está cumprindo muito bem a meta estabelecida, de recuperar o peso do nascimento em até duas semanas. Provavelmente a alcançará antes disso.

Quando eu estava na maternidade esperando o Nicolas (na sala de espera, claro), vi uma cena que há muitos anos não se vê mais com facilidade no Brasil. Um pai sai da sala de parto, onde acompanhava a esposa e vem à sala de espera contar a novidade aos pais dela: "nasceu, é um menino!" Sim, aqui ainda é comum as gestações chegarem ao final sem que os pais saibam o sexo da criança.

Sim, sim, o governo inclui exames de ultrassom no acompanhamento gratuito da gravidez. Mas desde que alguém entrou com um processo de perdas e danos porque tinha sido informado que seria um menino e nasceu uma menina (ou vice-versa), o governo não informa mais o sexo. E nas clínicas particulares o exame é cercado de grades precauções e os pais são avisados que não é 100% garantido.

Minha mulher, que teve e criou três filhos em Florianópolis (com uma ajuda mínima deste que vos fala), participa entusiasmada da conversa com a midwife. No primeiro filho nosso pediatra particular, o Fernando Boing, até foi lá em casa uma vez. Mas o normal (pelo menos naquela época, final da década de 70) era a gente ir atrás. Quem podia colocava o nenem no carro (sem cinto, sem cadeirinha) e ia à clínica particular. Ou tentava resolver as principais dúvidas por telefone.

Bom, a midwife já foi. Nos próximos dias virá uma outra agente, para fazer a programação de vacinas e a transição desse atendimento intensivo dos primeiros dias, para o atendimento normal do sistema de saúde. E isso que ele nem é cidadão britânico. O fato de ter nascido aqui não lhe dá automaticamente a cidadania. Os pais precisam ser residentes permanentes por alguns anos (parece que cinco) e o Danilo e a Marta estão aqui há apenas três. Pra todos os efeitos, ainda que seu nascimento tenha registro oficial aqui, Nicolas é brasileiro.

E aí já começa o sofrimento: terá que ir a Londres, porque só lá tem consulado, para ser registrado e fazer passaporte. Será que enfrentrará sua primeira fila?

quarta-feira, 9 de fevereiro de 2011

Cartão postal

Reuni algumas fotos da cidade (e de um castelo que fica próximo), escolhidas meio aleatoriamente, pra dar uma idéia do lugar e também para aliviar um pouco a saudade antecipada, que já começa a surgir à medida em que a data de ir embora se aproxima. Ao fundo, uma música do norte da Escócia, para entrar no clima.

Sensação de segurança

Fui imprimir umas fotos na maquininha que tem num supermercado aqui perto de casa. A máquina, que a gente mesmo opera e que imprime as fotos em papel fotográfico na hora, fica numa área mais perto da saída, num hall onde também ficam as lojinhas (lavanderia, lotérica, ótica, farmácia, etc) que em geral compõem o "centro de compras" dos supermercados maiores.

A gente enfia o pendrive, seleciona as opções na tela e a máquina, em pouco tempo, solta as fotos numa caixinha e imprime a notinha. O cliente então pega a notinha e sai atrás de um caixa para pagar. Sozinho. Nenhuma barreira física impede que o sujeito pegue as fotos e saia do supermercado. Não tem ninguém fiscalizando o uso da máquina. Talvez, remotamente, alguma câmera registre aquela área. Mas o normal é pegar a notinha e ir ao caixa (que nem fica tão perto assim) para saldar sua dívida.

No centro da cidade fui comprar uma garrafinha de água numa lojinha tipo mini-mercado, bem pequena. A geladeira com águas e refrigerantes ficava logo na entrada. O caixa, lá no fundo. No Brasil (e em muitos outros países ou mesmo em grandes cidades de "primeiro mundo") o pessoal tem que fazer um cerco físico na saída e em geral o cara que cobra fica junto à porta. Isso de pegar a mercadoria lá perto da porta e depois ter que ir corredor adentro procurar onde paga, era novo pra mim.

As casas não têm muros, grades e portões. Quer dizer, algumas têm muros e cercas. Quando não são baixinhas, têm a função de proteger da visão externa algumas áreas. Nada que impeça seriamente a entrada. As posturas municipais determinam como se deve construir, definindo com grande detalhe o estilo arquitetônico. E numa das regiões todos os edifícios são de dois andares, com quatro apartamentos cada um. Os apartamentos térreos têm portas para a rua, como se fossem casas e os do andar superior podem ser acessados por uma escada no centro do prédio. Coberta, mas sem porta ou portão. E sem muros.

O condomínio onde mora meu neto (e seus pais, claro), fica à beira de um rio, onde tem um caminho muito utilizado tanto por quem corre ou caminha para se exercitar, quanto para passeios nos finais de semana (mostro um trecho no filminho que coloquei ontem). E o que separa essa trilha dos edifícios é uma cerquinha de madeira. A proteção é dada, naturalmente, por uma plaquinha onde se informa que aquilo é propriedade particular e que a entrada só é permitida para moradores. Parece ser suficiente, porque não se tem notícia de problemas por ali.

Não há uma preocupação generalizada com garagens para os carros. Muitos pernoitam na rua. Tanto na rua mesmo, via pública, quanto dentro da propriedade, mas ao relento. Sem portões, grades ou muros altos. É um problema nas manhãs frias de inverno, porque antes de sair tem que raspar o gelo dos vidros, passar o anticongelante e, se for o caso, tirar a neve. E a verificação mais fácil da escassez de garagens é, logo depois das nevascas, ver os carros, nas ruas e nos estacionamentos de shoppings com restos de neve no teto. Os que estão limpinhos (porque ficaram em algum abrigo protegido) são muito raros.

O condomínio onde mora minha filha tem área de estacionamento para os carros dos moradores, "protegida" por um muro e um portão. Não é muito grande e às vezes falta lugar para carros de visitantes ou quando tem mais de um carro no apartamento. Um vizinho, que tem uma BMW Z4, às vezes deixa o carro estacionado do lado de fora do muro. Durante a noite! E dias inteiros. O normal é ninguém mexer nos carros. E encontrar o carro no mesmo lugar (se estiver em local onde é permitido estacionar), horas ou dias depois.

Fiz compras em três supermercados de grandes redes (Tesco, Asda e Sainsbury) e em todos, se a gente se distrair, acaba saindo com o carrinho de compras da área onde ficam os caixas. Não há barreiras físicas que levem ao "embretamento" do usuário, entrando ou saindo por uma única passagem estreita. Pode-se entrar direto, como nas lojas de departamentos. Na saída, o normal é procurar os caixas.

Essas historinhas, contadas com o deslumbramento de um manezinho cansado de tanta "sensação de insegurança" na terra natal, não significam que no Reino Unido não existam ladrões e criminosos em geral. Ou que seja assim também nas grandes cidades, como Londres e Glasgow. Mas o fato é que, nestas poucas semanas, tenho desfrutado de uma sensação de segurança que é muito agradável. O normal não é o roubo, o golpe, bater carteira, enganar no troco. Isso até deve acontecer, claro, mas não no nível endêmico que temos aí em casa, onde o normal é que tudo o que não estiver amarrado ou gradeado, será roubado. E a vida, ora, a vida não vale dois tostões.

terça-feira, 8 de fevereiro de 2011

O roteiro de todo dia

Como já sabem os leitores habituais, estou hospedado num hotel bem próximo do apartamento da minha filha (e do meu novo neto). Ontem de manhã nevou bem na hora em que eu estava indo, para cumprir meu expediente diário. Como vivo de câmera em punho, gravei em vídeo alguns trechos da caminhada debaixo da nevasca. E ao colocar no computador, vi que uns dias antes tinha gravado mais ou menos os mesmos trechos num dia ensolarado. Aí não resisti e juntei o sol e a neve na mesma caminhadinha.

Taí:



Ah, a moto BMW esquecida na neve e o Audi são dos vizinhos.

EM TEMPO

Hoje de manhã, quando não tinha mais neve nem estava chovendo, o cuidadoso dono da motocicleta tratou de cobri-la. :-)

segunda-feira, 7 de fevereiro de 2011

O direito de ir e vir

Nota do editor: como estou há alguns dias sem publicar nada e não queria demorar ainda mais, vou colocar no ar este texto ainda sem as ilustrações. Depois, assim que der tempo, coloco algumas fotos.
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É mais ou menos inevitável que, ao viajar, a gente comece a fazer comparações entre o que encontra e o que temos e casa. Geralmente observamos com mais atenção aqueles aspectos que nos incomodam mais. E, como pano de fundo, ainda levamos na mala aquela velha mania ("tendência recorrente" diriam os modernos) de achar a grama do vizinho é sempre mais verde.

"PEGA O ÔNIBUS AÍ EM FRENTE"

Quando fizemos aquela parada inesperada em Madri, logo no começo da viagem, no dia 19 de dezembro, a gente resolveu ir passear no centro da cidade. Aí perguntei na recepção do hotel como fazer para ir até lá (estávamos próximo do aeroporto de Barajas). A mocinha disse, com naturalidade: "pega o ônibus número tal nesse ponto logo aí em frente".

Claro que minhas experiências florianopolitanas com ônibus de linha me deixaram com os quatro pés atrás. Mas resolvemos experimentar. E qual não foi a surpresa: apesar de ser domingo, não demorou muito. Além de permitir ir vendo a paisagem do lado de fora das janelas, ainda permite conhecer um pouco do pessoal local que usa o ônibus.

Foi um bom passeio, barato e rápido. E nos lembrou que, em muitas cidades do mundo, o carro individual é uma opcão, não uma necessidade.

"RODO-FERROVIÁRIA"

A cidade onde estou (Aberdeeen, no nordeste da Escócia), não é muito grande. O município (Aberdeenshire) tem cerca de 240 mil habitantes. Mas é a principal base, no Reino Unido, para as empresas petrolíferas que operam no mar do Norte, o que reforça bastante a economia da região. Que, de resto, é conhecida no mundo pela sua pecuária (a qualidade da carne dos bovinos da raça Aberdeen-Angus é lendária) e, claro, pelas destilarias de uísque.

E Dyce, o bairro onde minha filha, meu genro e agora também meu neto estão morando, é próximo ao aeroporto. Mal comparando, equivale ao Carianos aí em Florianópolis. A distância do aeroporto ao centro é mais ou menos a mesma que a daí. Talvez um pouco mais.

Como na maioria das cidades européias, tem uma estação ferroviária no centro da cidade. Que, como na maioria das cidades do Reino Unido, tem uma rodoviária bem próximo. Aqui, fizeram há pouco tempo (foi inaugurado em 2009), um shopping center rodeando as duas. É possível descer do trem e ir pegar um ônibus intermunicipal passando por dentro do shopping. Numa cidade de invernos rigorosos, essa caminhadinha ao abrigo do frio e da chuva tem o seu valor.

Como tem uma estação de trem próximo ao aeroporto e o aeroporto é perto de casa, dá pra ir ao cinema (no shopping) de trem. Mas também dá pra chegar de avião a Aberdeen e pegar um trem para alguma das cidades próximas. Ou mesmo para o centro da cidade.

Ah, daquele shopping (Union Square) a que me referi, sai um ônibus expresso para o aeroporto. Portanto, ao chegar de avião, é possível também pegar um ônibus que te deixa no centro. Mais precisamente ao lado das estações rodoviária e ferroviária.

Vou lembrando essas coisas porque sei como é chegar de avião a Florianópolis e não ter como sair do aeroporto. Dependendo do horário (e do atraso do vôo) não tem taxi, que é a única forma de transporte terrestre colocada à disposição dos viajantes. Sim, tem também ônibus de linha, mas é de uso complicado para quem não conhece as manhas do "sistema" local.

CARRO PRA QUÊ?

Em Londres, Paris, Madri, Barcelona, Moscou, Nova Iorque, Washington e mais umas tantas grandes cidades, o sistema de transporte coletivo conta com a ajuda inestimável do metrô. Que permite, dependendo da sua capilaridade, ir literalmente a todo e qualquer ponto da cidade sem grandes transtornos, rapidamente e a um custo razoável. Ninguém precisa ter carro

Nas cidades menores, como Aberdeen, o carro ainda tem seu valor, dependendo de onde a pessoa mora. O ônibus, em todo caso, é uma boa opção. Outro dia tinha ido ao supermercado aqui perto de casa (a pé, doze minutos de caminhada) para pegar meus óculos (outra hora conto essa da ótica com oftalmologista dentro) e resolvi experimentar o ônibus para ir de lá até o centro.

Claro que, com as paradas e passando pelos locais mais habitados, o ônibus leva uma hora para fazer um trajeto que o trem, que é direto, leva dez minutos. Mas é muito amigável. Pra começar, a entrada é no nível da calçada. Ninguém precisa se esgarçar para "subir" no ônibus. Nos pontos com abrigo, tem um painel mostrando quantos minutos falta para o próximo ônibus chegar. E o ônibus para em cada ponto exatamente no horário em que deveria parar. Entra cachorro (acompanhado de seus donos, claro), entra bicicleta, entra velho, entra moço e ninguém precisa ficar se agarrando nas curvas pra não cair, nem tem freadas abruptas.

A caminhada da estação de trem de Dyce até em casa é relativamente longa. Uns 20 minutos, meia hora. Se está chovendo ou nevando, o jeito é pegar um taxi. Taxi é sempre um carro maior, confortável, espaçoso. Nada de carro "popular". E o preço, comparado com Florianópolis, não é assustador. Esse trajeto aí dá umas cinco libras (cerca de R$ 13,00).

Aquele pensamento inicial, meio que típico de brasileiro em férias, "preciso alugar um carro" foi abandonado logo nos primeiros dias. A gente tem conseguido se virar sem carro. Claro, para algumas coisas tem os carros da família, mas o Danilo trabalha e a Marta está ocupada com o filho, o que impede de tê-los o tempo todo à disposição. E por causa do seguro e da legislação local, não é qualquer um que pode dirigir qualquer carro. Para usar os carros deles sem que um deles esteja dirigindo, é necessário fazer autorizações e pagar adicionais no seguro. Se fosse o caso, seria mais fácil e rápido alugar um carro.

Ah, e tem outra coisa que ajuda a encarar as idas e vindas com mais tranquilidade e até com uma certa inveja: acidentes de trânsito são raros. E em geral menos graves que aí. Aquelas imagens quase diárias, de carros completamente destroçados, gente presa nas ferragens, a macabra estatística de milhares de mortes, sem falar nos aleijados, nas famílias traumatizadas, não existem por aqui. São realmente acidentes, que acontecem de tempos em tempos e geram grande comoção. Aí nem podem mais ser chamados de "acidentes", porque são rotina. É coisa do dia-a-dia a que, lamentavelmente, estamos nos acostumando.